* Artigo publicado originalmente no site da Comunidade Experts em Condomínios – CEX
No início do ano passado, fui convidado a participar do Projeto Nazaré, no município de Porto Alegre/RS, como mediador de conflitos. Este projeto foi considerado o maior da história de Porto Alegre/RS, pois envolveu o reassentamento de quase 2.000 famílias para um futuro melhor. As famílias receberam orientações de mediação de conflitos, gestão condominial, educação ambiental, patrimonial e social, eixos importantes para a organização comunitária.
A comunidade Nazaré estava localizada há 50 anos em uma área sem infraestrutura básica, como saneamento, calçamento, ruas asfaltadas, coleta seletiva, iluminação etc. As famílias da Nazaré foram realocadas em dois empreendimentos do Programa Minha Casa Minha Vida, a fim de que tivessem acesso à segurança, infraestrutura e saneamento.
O projeto era composto por quatro eixos, sendo um deles o de gestão condominial, que era formado por um gestor de condominial, um contador, um advogado e um mediador de conflitos. O assessoramento também auxiliou na implementação e organização de 17 condomínios em um dos empreendimentos e 39 condomínios em outro empreendimento.
Dentre as principais atividades do eixo gestão condominial, estavam a orientação, o esclarecimento, a capacitação dos representantes dos condomínios, a realização de assembleia para eleição do síndico, do conselho consultivo e de representantes dos blocos, a elaboração de ata, a realização de assembleias para informar aos beneficiários o custo de manutenção e consumo do condomínio, os cuidados para a conservação do patrimônio, as legislações que são aplicadas na área condominial, as obrigações do síndico, do conselho fiscal e dos condôminos, questões referentes ao registro de convenção de condomínio, a importância do regimento interno e execução de curso de capacitação de síndicos e conselho fiscal.
Conforme referido acima, um dos profissionais que integravam o eixo condominial era o mediador de conflitos. Este profissional, imparcial e neutro, atuava como uma ponte, auxiliando os envolvidos na solução dos conflitos, na retomada do diálogo, para que o impasse fosse solucionado sem a necessidade de buscar o judiciário.
Mas o que este relato em a ver com o objetivo do presente artigo? É o que será abordado agora.
O síndico é a engrenagem fundamental para a convivência harmoniosa em um condomínio. Ele pode mediar conflitos, mas precisa ser imparcial e neutro. Só que sendo síndico morador, muitas vezes ao tentar solucionar um conflito, se depara com o surgimento de outros, devido, por exemplo, à problemas pessoais com moradores, o que pode pesar no momento de resolver a disputa. Outra consequência é que um acordo, com o passar do tempo, pode gerar questionamentos por parte de um dos envolvidos, dependendo da forma como transcorreu essa construção.
Uma das grandes aflições dos síndicos nos empreendimentos referidos era o alto índice de inadimplência. Em uma das quadras chegou a 100% de não pagantes. O pagamento da taxa condominial é importante para a manutenção das áreas comuns, para que quem paga em dia não tenha que pagar pelo inadimplente, para manter valorizado o imóvel, para trazer melhorias e segurança ao condomínio, para poder votar nas assembleias etc.
Dentre os questionamentos dos condôminos podemos destacar a desconfiança com o síndico, a falta de transparência na gestão condominial, o desconhecimento dos motivos pelos quais se fazia necessário o pagamento da taxa condominial.
Em virtude desse quadro alarmante, foi montada uma força tarefa. Uma cartilha foi elaborada, com explicações sobre a importância do pagamento da taxa condominial e entregue a cada um dos condôminos. Foram realizadas reuniões com moradores de cada bloco para esclarecer dúvidas e conscientizá-los que o não pagamento da taxa condominial traria consequências para todos.
Ademais, o mediador de conflitos contatava os moradores mais inflamados e realizava a chamada pré-mediação individual, para esclarecer como se daria o procedimento. Em um segundo momento era realizada a sessão conjunta, ou seja, com a participação do síndico. E, quando necessário, foram realizadas sessões individuais para compreender os interesses, as necessidades que estavam encobertas pelas posições que motivavam o não pagamento da taxa condominial.
Como resultado, as inseguranças, as desconfianças e o desconhecimento foi dando lugar ao diálogo, à compreensão, ao entendimento e o tão aguardado pagamento das cotas condominiais. O percentual inadimplência foi reduzido de 100% para impressionantes 5%. E o melhor, sem precisar recorrer ao judiciário.
Diante do relatado, conclui-se que o diálogo era o ingrediente fundamental que estava faltando, para a compreensão sobre a importância do pagamento da taxa condominial, que beneficiaria a todos. Aliás, uma dica interessante é incluir na convenção do condomínio o emprego da mediação para a solução de conflitos antes de buscar o judiciário.
Restou demonstrado que a mediação de conflitos condominial para a solução de controvérsias pode ser uma aliada importante, com resultados satisfatórios. E mais, contar com a mediação pode ser benéfico, pois muitos condôminos veem o síndico morador como uma pessoa parcial, por mais imparcial que ele seja na condução dos trabalhos.
Por fim, buscar sempre o judiciário para resolver conflitos que poderiam ser solucionados com o auxílio da mediação pode trazer surpresas, como o resultado pretendido sendo diverso do esperado. Além disso, no judiciário os envolvidos não participam desse processo para a solução do conflito condominial. Sem dúvida, a mediação pode ser uma ferramenta benéfica para resolver os conflitos condominiais, uma vez que os moradores precisam conviver no dia a dia e também participar das assembleias para a tomada de decisões.
Como sempre gosto de destacar: o diálogo constrói soluções!
Carlos Eduardo Chiapetta
Mediador de Conflitos e Advogado
@carloseduardochiapetta
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